Nossa sociedade tem presenciado um avanço significativo em relação às qualidades socioemocionais. Se tornou substancialmente mais presente na mente dos indivíduos a preocupação com o bem-estar do próximo, principalmente com o dos menos favorecidos. No espectro político das novas gerações, a ideia de “justiça social” ganhou relevância e a empatia ganhou espaço.
De fato, isso é algo a ser celebrado, afinal, um avanço nas essências humanas é extremamente positivo para deixar mais prazerosa as relações sociais de uma comunidade. Mas, quando essa empatia transcende a esfera pessoal e chega às instituições o resultado não é tão interessante.
O ESTADO E A JUSTIÇA SOCIAL
A noção de qual deve ser a função do Estado tem sofrido mudanças. De uma instituição idealizada para ser sólida e neutra, o aparato estatal passou a buscar satisfazer os anseios da população por “justiça social” e com isso, consequentemente, tornou-se uma instituição não mais sólida e neutra, mas sim bastante arbitrária e imprevisível.
Essa ideia do Estado como um “justiceiro social” pode ser justificada pela consolidação e avanço das ideias de Rousseau sobre democracia. Segundo o autor, o governo ideal é o governo que mais exprime a vontade geral. E o que seria isso?
Contrapondo-se à ideia da democracia liberal – a qual o Estado se torna mais ideal quanto mais ele se limitar a proteger os direitos fundamentais –, a democracia rousseauniana parte do princípio de que quanto mais o Estado atende as demandas da população, mais ideal ele se torna.
Essa noção de democracia está no cerne dos estudos de direito e política ao redor do mundo e bastante enraizada nas nossas instituições. E tendo em vista o aumento da demanda popular por “justiça social”, é compreensível a consequente institucionalização desses desejos e a mutação do comportamento do Estado.
ARBITRARIEDADE E SUBJETIVIDADE
A questão, em si, não é criticar o desejo da população por uma sociedade mais justa. O que se busco neste texto é fazer um alerta em relação aos precedentes que a institucionalização desses desejos subjetivos podem abrir.
É indiscutível a capacidade que o Estado tem de influenciar o modo com que os integrantes dessa instituição enxergam as questões políticas. As práticas comuns e realizadas a longo prazo são absorvidas e interpretadas como normalidade entre os cidadãos.
A questão tratada acima sobre democracia rousseauniana é parte chave da nossa política desde a Proclamação da República. O nosso Estado sempre assumiu a posição de “condutor” do progresso (seja ele qual for), com aval do povo.
Quando temos um governo que age dessa maneira, absorvendo os anseios populares e buscando satisfazê-los, a população fica a mercê do uso político e ideológico do Estado pelos diferentes mandatários.
O Estado é uma instituição. E como uma instituição, ele é formado por um conjunto de hábitos e ao mesmo tempo é um indutor de hábitos.
Quando mantemos a ideia de que é correto o uso do ente estatal como ferramenta para atingir fins subjetivos, abrimos precedente para atingir certos fins que podem não ser tão nobres quanto a busca por uma sociedade mais justa.
Uma vez aberto o precedente, as diferentes ideologias políticas que estiverem no poder não irão hesitar em utilizar o Estado como meio para atingir os fins almejados por elas, sejam eles quais for.
As ideias de uma população estão sempre sujeitas a alterações. E ao tempo que isso induz o Estado a absorver essas ideias, ele também impulsiona o avanço delas. Podemos citar como exemplo a Alemanha nazista.
O que culminou no avanço dos ideais totalitários e a consequente ascensão do nazismo foi justamente um longo período de mudança de ideais da população que foram incorporados pelo governo e posteriormente impulsionados pelo o mesmo.
O Estado Alemão passou a funcionar como uma ferramenta arbitrária conduzindo um povo em direção a um fim que, naquele momento, representava uma demanda da população.
CONCLUSÃO
Se torna difícil resistir a tentação de querer usar o Estado como propagador das nossas vontades quando toda nossa história é marcada por isso. Mas é necessário combater essa ideia do Estado como um condutor do progresso social e buscar sempre olhar para os possíveis ônus de uma alternativa que parece ser a mais adequada.
Devemos entender que ninguém é mais condutor desse progresso do que o próprio indivíduo, e é a ele que deve caber toda e qualquer forma de conquista social.
Lembremos que os governos são transitórios, e as ideologias estão sempre se alternando no poder. Então, se não queremos ser vítimas de uma imposição de práticas ideologicamente contrárias às nossas, devemos também abrir mão de impor.
Quem faz a democracia somos nós, portanto, devemos resistir ao impulso de tentar usar o governo para institucionalizar nossos desejos emocionais. A neutralidade e previsibilidade da instituição estatal deve ser resgatada a fim de evitar dar precedentes para consequências prejudiciais para a sociedade. E isso parte da compreensão dos cidadãos quanto a função primordial do Estado: proteção e garantia objetiva dos direitos fundamentais dos indivíduos.
Este artigo não necessariamente representa a opinião do SFLB. O SFLB tem o compromisso de ampliar as discussões sobre a liberdade, representando uma miríade de opiniões. Se você é um estudante interessado em apresentar sua perspectiva neste blog, envie um email para [email protected] ou [email protected]